domingo, 6 de julho de 2014

Sobre café requentado e imortalidade...


Hoje fui almoçar numa padaria perto de casa. São Paulo pode ter inúmeros defeitos, mas sempre haverá uma padaria na esquina que te sirva desde um pãozinho fresco até um almoço decente.

Terminada a refeição, a clássica garrafa plástica de café me espera ansiosa, olhando, impávida, dum cantinho disputado entre o balcão de doces e o de revistas. Claro, com "aquele" café requentado que eu não consegui tomar direito, porque apostando em café novo, sempre me dou mal.

Não tenho muitas vaidades (isso talvez seja um defeito), porém um de meus caprichos é não conseguir tomar café requentado. Não adianta maquiar no microondas, com leite quente ou água: sempre percebo aquele gostinho de palha de milho misturado com cinzeiro e chulé-de-dois-dias. É odioso.

Voltando para o trabalho, considerei minha falta de vaidade, ou de orgulho, por assim dizer, ou pelo menos de nunca ter pensado a respeito disso. Se há alguma coisa que nos move na vida é o nosso orgulho, dito como uma recompensa interna que se traduz em vaidade.

E o que me move? Pergunta sem resposta fácil, desanimei de início. Pensei na Medicina. Pensei na Cirurgia. Mas não pode ser só isso, afinal de contas há inúmeros médicos, inúmeros cirurgiões e - convenhamos - ninguém é insubstituível.

Aí eu lembrei a semana passada.

Estávamos num jantar animado, regado à pizza e muitas histórias, com vários ex-residentes que vi crescer, desde o início de sua formação em Cirurgia até o que são hoje: uns Cirurgiões Vasculares, outros Urologistas, Endoscopistas e Cirurgiões Plásticos...

Aos poucos, cada um deles foi contando alguma história particular, na qual eu estava presente (e não lembrava) e que havia, de certa forma, sido importante para eles naquele contexto. Era como se eu fizesse parte indissociável de sua bagagem.

Era isso.

Considero que sou apenas uma centelha pálida de energia, dentro de um universo que não cabe na minha cabeça. Não vim aqui com nenhum propósito nobre, nem uma missão fatídica. Sou um quase-nada. Não sei de onde vim, muito menos para onde vou. Aliás, eu nem me preocupo muito com isso.

Porém, saber que a minha centelha contamina outras, que por sua vez se expandem numa cadeia infinita de ganho de potência: esta é a minha vaidade, o que move este quase-nada.

E, de certa forma, também é minha humilde receita de imortalidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário