sexta-feira, 25 de julho de 2014

Carta aberta ao Papai Noel (2012)



Prezado velhinho,

Deve lhe causar certa estranheza uma carta de "gente grande", pedindo qualquer coisa, em meio a pedidos tão mais importantes das crianças. Não, não quero um videogame nem uma bicicleta, tampouco ganhar na loteria. Meu pedido é singelo, e para tanto precisaria eu, adulto, pegar uma máquina do tempo; e como nos filmes, voltar ao passado - como mero espectador da minha infância.

E lá eu veria uma menino gordinho, nascido no interior de Santa Catarina, com certa dificuldade e sofrimento da mãe, pelo parto normal.

Já em outra cidade, não vejo esse menino lembrando de seus pais juntos. Numa casa simples de madeira, muito aconchegante, vejo-o agora brincando num quintal que parecia infinito, em meio a goiabeiras, galinhas, cachorros... Ora montado numa motoquinha, ora empurrando o carrinho de bebê de sua irmã, loirinha, que acaba de nascer.

Debaixo do chão da casa o menino construía... casas. De pedaços e sobras de madeira. E de sonhos. E de exemplos do avô faz-tudo: marceneiro, carpinteiro, encanador, eletricista...

Ele aprendera a ler muito rápido; a mãe o ensinara antes da escola. Sempre com um elefantinho encardido, de pelúcia, a tiracolo.

Menino, mãe, irmã... E só. Seria assim por um bom tempo. Agora em outra casa, de cimento e telhado firmes, ele cuidava da pequena, enquanto a mãe trabalhava.

Cuidando e aprontando traquinagens, sempre repreendidas duramente, mas raramente repreensíveis. Desenhava casas, figuras geométricas no papel.

O bicho de pelúcia havia se perdido na mudança. O cachorro querido, de doze anos de idade, fora envenenado por algum vizinho.

O menino enterrou o cachorro - enorme - no quintal.

Logo depois a família de três junta-se a outra família. Novas relações. Novos reveses. Trabalhando desde muito cedo. Trabalhando e indo à escola. Trabalhando muito.

As casas sumiram dos desenhos. Apenas figuras geométricas.

Depois o menino cresce, vem a faculdade e a vida adulta. E eu desembarco da minha viagem, no hoje.

O senhor pode pensar, querido Noel, que com essa história talvez eu queira lhe pedir para "refazer" o passado. Não é o caso.

Tudo o que eu queria era dar um abraço nesse menino, fazendo as pazes com ele.

Feliz Natal.
Marcos.


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